quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Ciclo


Ciclo
Para os pais os filhos nunca deixam de ser crianças. Acho que quando olham para os filhos é exatamente o que vêem: a menininha de cara suja e tranças e o homenzinho de calças curtas.
É mais ou menos assim que nós, os filhos, vemos também os pais, os tios... os vemos como seres eternamente pais, eternamente tios, que nunca saem daquele estado que tinham quando éramos de fato crianças. Sempre estarão ali, sem envelhecer demais, sem perecer.
Pensando nisso vejo que nós, assim como eles, gostamos de ser seus eternos bebês. De ter sempre o amparo do seu colo quando ralamos o joelho e voltamos correndo com lágrimas nos olhos, de ter nossos dedos apertados entre os seus quando andamos pela rua, de ter o apoio dos seus braços seguros e confiantes a pedalar e nos equilibrar na bicicleta (mesmo que ela tenha rodinhas de segurança), nos trazendo um saboroso café com leite e bolachas no meio da noite quando pedimos... tantas coisas!
Mas de repente, enquanto damos a grande volta no gira-gira do parquinho da praça da vida, aqueles que sempre nos ajudaram a atravessar todas as ruas ralam o joelho e somos nós que precisamos cuidar da ferida, são os seus dedos que passam a ser apertados entre os nossos, são os nossos braços seguros mas nem tão confiantes que devem ajudá-los a caminhar e, principalmente, são esses braços que devem abraçar forte, forte forte.
Nesse momento vemos que seus cabelos embranqueceram, seus corpos não tem mais o mesmo vigor, sua agilidade não é mais a mesma... e sim, eles perecem... e um dia partem... talvez partam no momento que percebem que podem ir sem que corramos tanto perigo, como a mãe que só vai para o trabalho depois de deixar o filho em segurança na escola.
Talvez se deixem ser cuidados por nós como um teste para ver se somos capazes de cuidar de nós mesmos.
E de repente todos aqueles que sempre formaram uma barreira de proteção em torno de nós se tornam tão frágeis. E o mundo parece estar se degradando, mudando rapidamente, tomando outros contornos. Olhamos para os lados e percebemos que há espaços vazios que são preenchidos somente por uma incrível saudade.
Aí a gente se vê de novo menino, comprando um sapinho de pano e jogando moedas na fonte da Praça da Sé de mãos dadas com alguém que já não está mais aqui. E apesar da sensação de desamparo, constatamos que uns partem e outros chegam. E crianças iluminam o nosso coração. São brotos das novas plantas que irão colorir os jardins daquela pracinha do gira-gira...
E o ciclo continua, infinito em si.

Rita Brafer (30/09/2009)

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